fevereiro 25, 2007

a primeira versão


PLAY Symphonie Fantastique
Devia ter os meus 14-15 anos quando ouvi pela primeira vez a Symphonie Fantastique de Berlioz. Ainda hoje tenho presente a sensação que tive: um misto de deslumbramento, magia e suspense. Não pude deixar de pedir o CD emprestado, gravar uma cassete. Era impensável comprar o CD na época. Reproduzi-a tanto!

PLAY Concerto de Aranjuez

Talvez com 16-17 anos, assisti a um documentário da RTP2 sobre Joaquín Rodrigo e ouvi, emocionada, pela primeira vez, o Concerto de Aranjuez. O impacte em mim, do 2º andamento, foi fulminante. Continua a ser, de cada vez que repito a experiência, mas naquele momento rendi-me por completo e desfiz-me em lágrimas, quer pela beleza do concerto, quer pela história que o mesmo encerra, da alegria do nascimento, à tristeza e aceitação da morte prematura do filho de Rodrigo. Consegui gravar em VHS uma boa parte do documentário, bem acomodado nos intervalos de outras gravações esquizofrénicas que ainda hoje sobrevivem: Casa dos Espíritos, Adeus Pai, Darwin e Simpsons. Quase devo ter gasto a fita de tanto ter retrocedido e avançado.

PLAY Symphony 3

Por volta dos meus 19 anos, um primo, cujo percurso profissional o fez passar uma temporada na Polónia, trouxe um CD de Gorecki da Sinfonia n.º3 do qual eu gravei um CD e fotocopie a cores, em jeito de luxo, a capa. Uma vez mais o dinheiro estava longe de ser suficiente para suportar o capricho de adquirir o original, já não contando com a dificuldade que seria encontrá-lo. Mas isso não me impediu que ainda hoje  não consiga traduzir por palavras (pelo menos daquelas que eu conheço) a sensação que tive ao ouvir o 1º andamento pela primeira vez. Não fazia ideia que de entre a orquestra uma voz, que por breves momentos se confundia com os restantes instrumentos, irromperia por eles num grito próximo das coisas divinas, daquelas, que existindo, não se descrevem. O CD já está riscado de tanta rotação.



Quando começou a ser possível, por razões monetárias, adquirir originais, estas três obras estavam na lista das minhas prioridades. E procurei-as. E encontrei-as. Em Leiria, em Aveiro, em Lisboa, no Porto. Mas nenhuma me satisfez. Nenhuma foi capaz de igualar as interpretações que me tinham conquistado pela primeira vez. E fui adiando a aquisição. O Gorecki acabou por me ser oferecido, e está como novo, o Rodrigo também apareceu cá em casa e o Berlioz, tenho-o fruto de uma qualquer coleção que fiz. Mas nenhum dos originais me satisfaz, ou outros irão satisfazer, como as primeiras versões que ouvi. Hoje, impondo alguma racionalidade nesta análise, estou certa que nunca encontrarei versões que igualem ou suplantem as minhas gravações, não porque o mérito dos intérpretes seja inferior mas, simplesmente, porque não há mesmo amor como o primeiro, mesmo que de uma gravação tecnicamente medíocre se trate. Talvez por isso raramente goste de transcrições de obras e, quando acontece gostar, é mesmo porque o contacto com a transcrição antecedeu o do original.