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abril 04, 2015

©Josef Koudelka. CZECHOSLOVAKIA. Prague. 1965. Theatre Divadlo Za Branou (Beyond the Gate).
 "Masks from Ostend", a play written by Michel de GHELDERODE and directed by Otomar KREJCA

DA MITOLOGIA
    Primeiro era um deus da noite e da tempestade, ídolo negro e sem olhos, diante do qual saltavam nus e lambuzados de sangue. Mais tarde, nos tempos da república, eram imensos os deuses, com mulheres, filhos, camas desconjuntadas e raios que explodiam inofensivos. Por fim só os neuróticos supersticiosos carregavam no bolso pequenas estátuas de sal, representando o deus da ironia. À época não havia maior deus.
   Vieram então os bárbaros. Também eles tinham em alta estima o pequeno deus da ironia. Esmagavam-no sob os calcanhares, adicionando-o depois aos seus manjares.

Zbigniew Herbert (1924-1998)
(Trad. Rui Knopfli)
Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro, 2001, Assírio&Alvim

abril 03, 2015

©Christopher Anderson. VENEZUELA. Caracas. 2006. Reflection in window in Altamira.   
"As minhas tias, aquelas numerosas semi-mães, que se esforçavam por me levar a reboque, mas que me amavam de verdade, tentaram por anos a fio influenciar-me para que eu estabilizasse como alguém que se visse, ou seja, como advogado ou burocrata - a minha indefinição era-lhes profundamente incómoda, não sabiam como conversar comigo, nem quem eu era e, no máximo, remoíam coisas como:
   -Józio - remoíam - Já está mais do que na hora, meu querido! O que dirão as pessoas? Se tu não queres ser médico, pelo menos sê ao menos um mulherengo ou um especialista em cavalos, mas torna-te em alguma coisa... em algo de concreto..."

"Recordações!  A maldita da humanidade reside no facto de a nossa existência neste mundo não tolerar uma hierarquia fixa e definida, visto que tudo flui e reflui em movimento permanente e que cada um de nós tem de ser percebido e avaliado pelos demais, e que a percepção que têm de nós os menos esclarecidos, os mais limitados e burros é-nos tão importante quanto a dos inteligentes, esclarecidos e subtis. Porque o homem, no fundo do seu ser, depende da imagem impressa na alma de outro homem, mesmo que a alma em questão seja a de um cretino. (...) Oh, estes julgamentos humanos, este abismo de conceitos e opiniões sobre a tua inteligência, o teu coração, o teu carácter, sobre todos os pormenores do teu organismo - que agora se expõem face àquele descarado que vestiu os seus pensamentos com letra impressa e os distribuiu aos homens em folhas de papel, oh, papel e mais papel, letras e mais letras.  (...) Na verdade, no mundo do intelecto, a violação é constante, não conseguimos fazer-nos valer por nós mesmos, mas vivemos em função dos outros, temos que ser como os outros nos vêem. (...) Ah a sensação de (...) ser ingénuo porque um ingénuo acha que sou ingénuo-, de ser estúpido porque um estúpido acha que sou estúpido-, de ser verde porque outro imaturo me mergulha e me banha no seu verdor-  ah, isto tudo poderia endoidecer-nos não fosse uma palavra - "mas" - que torna a vida tolerável!

Witold Gombrowicz,
Ferdydurke, 7Nós, 2011

©raquelsav. 2015.WARSOW. Pintura de Håkon Gullvåg
Depois do fim do mundo
depois da morte
me achei no meio da vida
criava a mim mesmo
construía a vida
gente animais paisagens

isto é uma mesa eu dizia
isto é uma mesa
sobre a mesa repousam o pão a faca
a faca serve para cortar o pão

é preciso amar o homem
eu dizia de noite e de dia
o que é preciso amar
eu respondia o homem
[...]
Tadeusz Rózewicz (Trad. Henry Siewierski)

Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro, 2001, Assírio&Alvim


março 31, 2015

fotograma do filme Ida do realizador polaco Pawel Pawlikowski

"-Às vezes tens maus pensamentos?
- Sim.
- Sobre o amor físico?
- Não
- Que pena! Assim, qual o valor dos teus votos de castidade?"

março 28, 2015

©raquelsav.Lodz.2015
PLAY Zbigniew Preisner Lament (Lisa Gerrard)

Encenamos despedidas,
enquanto falamos por línguas de fogo,
línguas da boca para dentro,
exercícios extremos de lugar
ou tão somente de silêncio.

Insistimos nessa espécie de tempo falado,
um tempo oral das coisas que não se dizem,
subindo, como quem resvala,
por degraus que se afunilam,
inclinados sobre si.
Somos cada degrau
e o peso do desenho do pé,
a marca incerta que calca o chão morto.
Por isso, tocamos a pintura na (im)perfeição do traço,
entre pormenores fractais e borrões tolhidos,
carimbo rudimentar de tinta chinesa e permanente.

Construímos o tempo no uso dos pronomes interrogativos,
mas abominamos a senda dos pontos de interrogação.
Somos o quê da matéria que não fala,
que habita muito acima do porquê,
razão pura de hierarquia.
Por isso,
enquanto falamos por línguas de fogo, 
comungamos do nosso tempo - 
como extensas vítimas do silêncio. 


março 23, 2015


©raquelsav. Muzeum Kinematografii. Lodz (Polónia) 20 Março 2015
(...)
Prefiro os zeros à solta
a tê-los numa fila junto ao algarismo.
Prefiro o tempo do insecto ao tempo das estrelas.
Prefiro fazer isolar.
Prefiro não perguntar quanto tempo ainda e quando.

Prefiro levar em consideração até a possibilidade
do ser ter a sua razão.

Extracto de POSSIBILIDADES de 

Wislawa Szymborska (Trad. Aleksandar Jovanovic e Henry Siewierski)
Rosa do Mundo- 2001 poemas para o futuro. 2001. Assírio&Alvim
©raquelsav. Muzeum Kinematografii. Lodz (Polónia) 20 Março 2015
TESTAMENTO
Após a morte de Deus
abriremos o testamento
para saber
a quem pertence o mundo
e aquela grande armadilha
de homens.

Ewa Lipska (Trad. Aleksandar Jovanovic)
Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro, 2001, Assírio&Alvim

março 21, 2015

Alguns gostam de poesia
Alguns -
quer dizer nem todos.
Nem a maioria de todos, mas a minoria.
Excluindo escolas, onde se deve
e os próprios poetas,
serão talvez dois em mil.

Gostam -
mas também se gosta de canja de massa,
gosta-se da lisonja e da cor azul,
gosta-se de um velho cachecol,
gosta-se de levar a sua avante,
gosta-se de fazer festas a um cão.

De poesia -
mas o que é a poesia?
Algumas respostas vagas
já foram dadas,
mas eu não sei e não sei, e a isto me agarro
como a um corrimão providencial.
Wislawa Szymborska

março 19, 2015


A   F   A   S   T   A   R
rima como 
A   P   R   O   F   U   N   D   A   R


©raquelsav. Łódź - Polónia  20 Março 2015 (Alexandre Farto (Vhils),    
  
 PLAY Frédéric Chopin- Arthur Rubinstein Noctunes

março 18, 2015


P   A   R   T   I   D   A
rima com
E   N   C   O   N   T   R   O

PLAY Henryk Górecki Sinfonia n.º 3                                                                 ©raquelsav. VARSÓVIA. 18 de Março 2015