"Por vezes vinha um motorista novo, e eu pensava: como é que eles escolhem estes filhos da mãe? Temos água profundas de ambos os lados e basta uma má decisão para o tipo nos matar. Era ridículo. Suponhamos que ele tem uma discussão com a mulher nessa manhã? Ou o cancro? Ou visões de Deus? Dentes podres? O que seja. Estava ao seu alcance. Mandar-nos a todos para o galheiro. Eu tinha noção de que, se fosse eu ao volante, consideraria a possibilidade ou a desejabilidade de afogar toda a gente. E, por vezes, na sequência de tais considerações, as possibilidades tornam-se realidade. Para cada Joana d'Arc há um Hitler empoleirado na outra ponta do balancé. A velha história do bem e do mal. Mas nenhum dos motorista chegou a mandar-nos para o galheiro. Em vez disso, iam a pensar em prestações do carro, resultados do basebol, cortes de cabelo, férias, clisteres, visitas de família. Não havia um homem a sério naquela pandilha. Eu chegava sempre ao trabalho maldisposto mas em segurança. O que prova por que é que o Shumann era mais raltivo do que o Shostakovich..."
Charles Bukowski (1975) | Factotum | Alfaguara | 2017
Charles Bukowski (1975) | Factotum | Alfaguara | 2017