|Assim repito o nome e sinto ainda o incêndio no rosto :|| paul celan |Porque é com nomes que alguém sabe | onde estar um corpo| por uma ideia, onde um pensamento | faz a vez da língua.| herberto helder
junho 20, 2024
junho 19, 2024
junho 18, 2024
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©Werner Bischof | 1948 | Finland |
A primeira transformação moral fundamental do ser humano terá porventura consistido na descoberta da moral. A maioria das espécieis animais conhecem regularidades de comportamentos que permitem e promovem a coesão de grupo. Os cardumes de peixes, que parecem seguir de forma fantasmagórica um ritmo inaudível, cooperam através da conformidade; insectos sociais como as abelhas ou formigas aperfeiçoaram uma divisão de tarefas que exige, muitas vezes, o autossacrifício total do indivíduo em benefício, repectivamente, da colmeia ou colónia. A especial forma de cooperação, que moldou a moral dos seres humanos, consiste em relegar para segundo plano o interesse da pessoa singular em benefício de um maior bem comum com o qual todos lucram. p.23
Hanno Sauer | Moral - A invenção do bem e do mal | Edições Saída de Emergência | 2023
junho 17, 2024
junho 15, 2024
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©raquelsav | jun 2024 |
PLAY Joaquín Rodrigo | Concierto de Aranjuez
Farei como Shiva me ensinou:
- alimentarei de dança suave o ímpeto destruidor;
- procurarei o movimento perpétuo dos braços, na busca do equilíbrio das mãos.
E, na esperança do reencontro, conservarei intacto o Cioran.
maio 26, 2024
maio 20, 2024
abril 16, 2024
abril 15, 2024
março 18, 2024
©raquelsav | 2014 | Lodz |
Se um quarto se pode abrir para o sonho,
quando a noite é pesada e o barulho da chuva entra
pela janela, já o sonho não se abre para quem não
dorme, enrolado na insónia como num velho
cobertor. Então, o que se passa pela cabeça são
os pensamentos que não se deveriam ter. Mas a
noite é assim: não faz distinção entre quem dorme
e quem está acordado; e o barulho da chuva
aumenta, com o vento, trazendo o que está
fora do quarto para dentro do quarto, e obriga
quem não dorme a agarrar-se ao cobertor, como
se fosse a última bóia no naufrágio da noite.
Nuno Júdice | Fórmulas de uma luz inexplicável
fevereiro 19, 2024
fevereiro 16, 2024
©raquelsav | 2022 | Somiedo |
fevereiro 08, 2024
fevereiro 02, 2024
janeiro 28, 2024
©raquelsav | 2022 | Astúrias |
“NÓS SOMOS
Como uma pequena lâmpada subsiste
e marcha no vento, nestes dias,
na vereda das noites, sob as pálpebras do tempo.
Caminhamos, um país sussurra,
dificilmente nas calçadas, nos quartos,
um país puro existe, homens escuros,
uma sede que arfa, uma cor que desponta no muro,
uma terra existe nesta terra,
nós somos, existimos
Como uma pequena gota às vezes no vazio,
como alguém só no mar, caminhando esquecidos,
na miséria dos dias, nos degraus desconjuntados,
subsiste uma palavra, uma sílaba de vento,
uma pálida lâmpada ao fundo do corredor,
uma frescura de nada, nos cabelos nos olhos,
uma voz num portal e a manhã é de sol,
nós somos, existimos.
Uma pequena ponte, uma lâmpada, um punho,
uma carta que segue, um bom dia que chega,
hoje, amanhã, ainda, a vida continua,
no silêncio, nas ruas, nos quartos, dia a dia,
nas mãos que se dão, nos punhos torturados,
nas frontes que persistem,
nós somos,
existimos.”
António Ramos Rosa
janeiro 27, 2024
©raquelsav | 2024 | Tomar PLAY Sitiados | Soldado |
“SOLDADO
Ai, esta eterna guerra
Ai, que me obriga a ser soldado
Já vejo a bandeira erguida
Já sinto a dor companheira
Ai, neste mar fico tão só
Por este mar
Liberdade onde vais?
Liberdade onde cais?
Esta luta é por te amar
Ai, este soldado que cerco
Ai, este soldado sou eu, sou eu!
Nos olhos a mesma dor
No peito um medo igual
Ai, sinto queimar este fogo, dentro de mim!
Liberdade onde vais?
Liberdade onde cais?
Esta luta é por te amar
Este sangue é por te amar
É por te amar”
Sitiados
Luís Miguel Cintra - "Canção X", de Luís de Camões
janeiro 25, 2024
janeiro 18, 2024
janeiro 14, 2024
©msvgon |2024 |
Padre: Sentes alegria com o suicídio da tua madrasta?
Hipólito: Não. Ela era humana.
Padre: Então onde é que vais buscar essa alegria?
Hipólito: Cá dentro.
Padre: Acho difícil de acreditar.
Hipólito: Claro que achas. Tu pensas que vida não tem sentido a menos que haja outra pessoa para nos torturar.
Padre: Não tenho ninguém para me torturar.
Hipólito: Tu tens o pior amante de todos. Não só pensa que é perfeito, como é. Sinto-me satisfeito por estar só.
Padre: A auto-satisfação é uma contradição logo à partida.
Hipólito: Eu posso confiar em mim. Nunca me desiludo.
Padre: A verdadeira satisfação vem com amor.
Hipólito: E quando o amor morre? O despertador toca é hora de acordar, o que é que se faz então?
Padre: O amor nunca morre. Evolui.
Hipólito: Tu és perigoso.
Sarah Kane | O amor de Fedra
janeiro 02, 2024
PLAY Squid | Pamphlets
Legs still but the herd is in motionCould you do another and could we be in motion?
Pamphlets through my door and pamphlets on my floor
Open wide, we’ve got everything, everything that you like
Squid
dezembro 17, 2023
©raquelsav | 2023 | Lagoa de Maiorca |
Olhamos tudo em silêncio na linha da praia
De olhos na noite suspensos do céu que desmaia;
Ai lua nova de Outubro, trazes as chuvas e ventos,
A alma a segredar, a boca a murmurar tormentos!
Descem de nuvens de assombro taínhas e bagres
Se as aves embalam os peixes em certos milagres;
Levita-se o corpo da alma, no choro das ladainhas,
Na reza dos condenados, nas pragas dos sitiados,
Na ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.
Livra-me da fome que me consome, deste frio;
Livra-me do mal desse animal que é este cio;
Livra-me do fado e se puderes abençoado
Leva-me a mim a voar pelo ar!
Como se houvesse um encanto, uma estranha magia,
O sol lentamente flutua nas margens do dia.
Despe o meu corpo corsário, seca-me a veia maruja,
Morde-me o peito aos ais, das brigas, dos punhais,
Da ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.
Andamos nus e descalços, amantes, sedentos
Se o véu da noite se deita na curva do tempo.
Ai lua nova de Outubro,
Os medos são medos das chuvas e ventos,
Da alma a segredar, da boca a murmurar
Adeus
Fausto Bordalo Dias
novembro 27, 2023
©raquelsav | 2023 |
Na Terra, não havia imunidade a ideias parvas… Na Terra, as ideias são como emblemas de amizade ou de inimizade. O seu conteúdo não importa. Os amigos concordam com amigos para expressar a sua amizade. Inimigos discordam de inimigos para expressar a sua inimizade… As ideias, como os emblemas, não puxava carroças… para ele, só havia uma maneira de a Terra ser: tal como era.”
Kurt Vonnegut | Pequeno-almoço de campeões
novembro 24, 2023
©raquelsav |
Quando eu morrer
Não me dêem rosas
Mas ventos
Quero as ânsias do mar
Quero beber a espuma branca
Duma onda a quebrar
E vogar
Ah, a rosa dos ventos
A correrem na ponta dos meus dedos
A correrem, a correrem sem parar.
Onda sobre onda infinita como o mar.
Como o mar inquieto
Num jeito
De nunca mais parar.
Por isso eu quero o mar.
Morrer, ficar quieto,
Não.
Oh, sentir sempre no peito
O tumulto do mundo
Da vida e de mim.
E eu e o mundo.
E a vida.
Oh mar
O meu coração
Fica para ti
Para ter a ilusão
De nunca mais parar
Fausto Bordalo Dias
novembro 23, 2023
©Gilles Peress | ZAIRE. Goma. 1994. Near the border of Rwanda |
Na noite anterior à sua partida, o discípulo dirigiu-se ao mestre:
- Mestre, estou de partida para a guerra. Disponho de inúmeras armas: facas, catanas, machados, espadas, armas de fogo, de entre muitas outras. Qual me aconselhas usar?
O mestre manteve-se em silêncio por alguns segundos e respondeu:
- Armas para combater homens?
- Sim, meu mestre - respondeu o discípulo.
O mestre refletiu, uma vez mais, e respondeu:
-Usa ratoeiras.
novembro 17, 2023
©raquelsav | 2023 |
é dela o acto calmo
os poros sapientes o sexo sorridente
a espera pouco lenta o lamento pouco longo a ausência
a serviço da presença
na cabeça farrapos de céu os pontos enfim mortos do coração
toda a graça tardia de chuva estiando
quando cai uma noite
de Agosto
é dela vazia
ele puro
de amor
Samuel Beckett | Poemas (1937-1939)
outubro 29, 2023
Fotograma do filme “o quadrado” de Ruben Östlund (2017) |
APELO
De vez em quando paramos de crescer. É da chuva, do frio, desta humidade a que estão sujeitos no norte ossos e barcos, árvores e pedras. É então grande a tentação da pocilga. Como se o fecundo calor do porco fosse uma promessa, um apelo, às nossas trevas, do sol escondido na palha apodrecida”.
Eugénio de Andrade, 1.12.1985
outubro 03, 2023
outubro 01, 2023
©raquelsav | 2023 | Loret del Mar |
PLAY Tuxedomoon | In a manner of speaking
In a Manner of speaking
I just want to say
That I could never forget the way
You told me everything
By saying nothing
In a manner of speaking
I don't understand
How love in silence becomes reprimand
But the way that i feel about you
Is beyond words
O give me the words
Give me the words
That tell me nothing
O give me the words
Give me the words
That tell me everything
In a manner of speaking
Semantics won't do
In this life that we live we live we only make do
And the way that we feel
Might have to be sacrified
So in a manner of speaking
I just want to say
That just like you I should find a way
To tell you everything
By saying nothing.
O give me the words
Give me the words
That tell me nothing
O give me the words
Give me the words
Give me the words
setembro 21, 2023
©raquelsav | 2023 | Switzerland Matterhorn |
Mais largo o espaço, o sol mais criador,
Mais refulgente a lua, o mar maior,
Mais cavadas as ondas e mais belas;
Mais amplas, mais rasgadas as janelas
Das almas, mais rosais a abrir em flor,
Mais montanhas, mais asas de condor,
Mais sangue sobre a cruz das caravelas!
E abrir os braços e viver a vida,
— Quanto mais funda e lúgubre a descida
Mais alta é a ladeira que não cansa!
E, acabada a tarefa... em paz, contente,
Um dia adormecer, serenamente,
Como dorme no berço uma criança!
Florbela Espanca