- CII -
|Assim repito o nome e sinto ainda o incêndio no rosto :|| paul celan |Porque é com nomes que alguém sabe | onde estar um corpo| por uma ideia, onde um pensamento | faz a vez da língua.| herberto helder
julho 31, 2024
julho 23, 2024
E dizem que no mar,
no meio das marinhas filhas de Nereu, uma vida imperecível
foi concedida a Ino, para todo o sempre.
Na verdade, dos mortais não está determinado
o termo da morte,
nem quando chegaremos ao fim do dia tranquilo,
filho do Sol, com o que há de bom incólume.
É que torrentes diferentes de lados diferentes
correm em direção aos homens com prazeres e dores.
no meio das marinhas filhas de Nereu, uma vida imperecível
foi concedida a Ino, para todo o sempre.
Na verdade, dos mortais não está determinado
o termo da morte,
nem quando chegaremos ao fim do dia tranquilo,
filho do Sol, com o que há de bom incólume.
É que torrentes diferentes de lados diferentes
correm em direção aos homens com prazeres e dores.
Píndaro (518 a.C. - 438 a. C.) | Poesia grega de Hesíodo a Teócrito | Quetzal | 2023
julho 20, 2024
julho 13, 2024
julho 11, 2024
julho 09, 2024
julho 04, 2024
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©Werner Bischof | Zurich. Switzerland | 1942 | Zebra Woman |
ELEGIA AZUL
Clara, como talvez tu antes da última esquina da noite,
Clara, como talvez tu antes da última esquina da noite,
uma imagem redonda colava-se aos meus dedos por entre
as folhas de papel que lentamente ardiam. Foram sempre
mais as páginas que juntei do que aquelas de que pude
separar-me, naquele T1 pequeno com vista para Monsanto
e para o teu corpo sempre azul.
Infelizmente, não fora capaz de preparar
o silêncio que sempre se segue a tudo o que
não somos, dirias tu, o rumor de instantes que nos apanha
na canga e nos sugere o vale sem luzes e a varanda grande.
Parado sei que isso é poesia, um sonho, pequenas alucinações
de primavera sem apelo no fundo destas veias e sei também
que continuas a existir e vais ser minha muitas vezes,
como eu quero seu teu intermitentemente em cada lua nossa.
Mas tu sabes como os astros nos pregam partidas ao telefone,
como em certos dias a pique para o sol embatem nas antenas,
e este ligeiro pesadelo é apenas o desconforto baço de saber
que há coisas demasiado belas para não serem tristes
Rui Costa (1972 - 2012) | Mike Tyson para principiantes: antologia poética | 2022 | Assírio & Alvim
julho 03, 2024
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©Hans_Baumgartner | Limmatquai in Zürich | 1938 |
"E lá fomos audazes por passeios tardios
Vadiando o asfalto, cruzando outras pontes de mares que são rios"
Fausto Bordalo Dias
HUMANO
Com o homem começa o invisível.
Com o homem começa o invisível.
O que se diz é o que se esconde, os olhos
giram para bem longe da sua fome.
O homem enche a sua fome de poemas,
os seus poemas de sonhos de amor,
os seus sonhos de amor de coisas impossíveis,
como a eternidade ou o lugar perfeito
onde nos deitaremos a ouvir o pensamento
dos pássaros, a água que corre aflita
com medo de ser pouca no chão tanto,
com a loucura do mundo a crescer no
nosso sexo, no nosso pensamento,
com o mundo a crescer vibrante a cada instante,
por dentro de nós, em nós, por fora de nós,
sem parar, sem memória, sempre,
sem fim, sem infinito, para lá das coisas que nos vencem,
para lá do sonho, nesse lugar além de tudo quanto
pode ser dito, de tudo quanto foi dito, além da história
do que somos, da vida que vivemos, todos, incluindo os mortos,
os que ainda não nasceram, os que se vendem, por dinheiro
ou excesso de tristeza, os que acreditam na vida, na beleza,
na utilidade prática da arte, na invencibilidade do amor,
na irmandade dos homens que constroem um mundo melhor,
homens e mulheres que estão aqui, ou que porventura
chegarão amanhã, quando nós e eles formos outros,
maiores que o dia que passou, que a noite que nos guarda,
quando o invisível for mais perto do braço que nos toca,
dos olhos onde revemos a história do mundo,
deste momentos onde parimos a luz
Rui Costa (1972 - 2012) | Mike Tyson para principiantes: antologia poética | 2022 | Assírio & Alvim
julho 02, 2024
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©Edouard Adelot | 1906 | Léffort |
PLAY Fausto Bordalo Dias | A memória dos dias
"Deixo-te uma palavrinha
Para te lembrares de mim"
Fausto Bordalo Dias
O PÃO
Há pessoas que amam
com os dedos todos sobre a mesa.
Aquecem o pão com o suor do rosto
e quando as perdemos estão sempre
ao nosso lado.
Por enquanto não nos tocam:
a lua encontra o pão caiado que comemos
enquanto o riso das promessas destila
na solidão da erva.
Estas pessoas são o chão
onde erguemos o sol que nos falhou os dedos
e pôs um fruto negro no lugar do coração.
Estas pessoas são o chão
que não precisa de voar.
Há pessoas que amam
com os dedos todos sobre a mesa.
Aquecem o pão com o suor do rosto
e quando as perdemos estão sempre
ao nosso lado.
Por enquanto não nos tocam:
a lua encontra o pão caiado que comemos
enquanto o riso das promessas destila
na solidão da erva.
Estas pessoas são o chão
onde erguemos o sol que nos falhou os dedos
e pôs um fruto negro no lugar do coração.
Estas pessoas são o chão
que não precisa de voar.
Rui Costa (1972 - 2012) | Mike Tyson para principiantes: antologia poética | 2022 | Assírio & Alvim
julho 01, 2024
©raquelsav | 2007 | Ponte das 3 Entradas |
PLAY Fausto: Aproximação à Terra + E Fomos Pela Água do Rio
creio-nos em almas escancaradas
de jangada que toma de assalto as ternuras e delícias que flutuam na desconjuntada periferia do tempo
como se ali estivessem estado sempre,
as ternuras e delícias,
revistas no tempo de sempre
em escassos cinco minutos
(dos nossos)
mas não!
terão passado quatro. ou teriam sido cinco mil?
daquela unidade de tempo maior
medida pela dança da Terra à volta do Sol
[sim, confirmei no Google a definição de um ano
(dos homens)]
o tempo é-nos sempre tão confuso
e a memória comum e a arqueologia dos dias de agora estão guardadas na magia de um clique
talvez à matéria das almas escancaradas não lhe assista factos tão perfeitamente inúteis
mas só podem ter sido quatro, ou teriam sido cinco mil?
unidades de tempo maior, condensadas num minuto
(do nosso encontro)
preciso-nos em almas escancaradas de gigante
sem garantir que o trajeto da nossa luz ao vazio se faça em porções de 1/299792458 de segundo ou em qualquer outra fração
perfeitamente maiores, seremos, pois,
nos passos do nosso encontro
à razão de sermos próximos das coisas que não se tocam,
feitos em pormenores do reflexo das árvores concretas
que flutuam e descansam nas águas do rio
na perfeita liberdade de ser-plano
(à tona do mundo de Edwin Abbott)
creio-nos em almas escancaradas
tão claras e distintas de detalhes
na complexidade que se esbate nas coisas planas e mágicas
em plena liberdade de existência
foge-nos o vício
da morbidez
(da que os homens se habituaram a querer viver)
e escolhemos a matéria etérea e fugaz para existir
em almas escancaradas ao sabor e aroma do perfume das chuvas
esgueiramo-nos, sensíveis, aos toques ímpios na água
(os que dissolvem a magia da revelação)
e somos de tal infinitas maneiras
que só o poema nos poderá eternizar.
sim, creio-nos em poesia!
sim, creio!
PLAY Fausto: O perfume das Chuvas
(Raquel, 1.março.2014)
Aceno ao barco que vai rio acima
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©raquelsav | 20 novembro 2022 | Aula Magna |
Quem esteve na Aula Magna em 2022, sabe que a despedida física, ao homem, começou, se não antes, ali. Uma luta desleal entre um homem frágil e a sua obra imensa, uma luta titânica. O choro foi colectivo, entre a emoção e eco da obra e a saudade de um homem que embora não tivesse partido, já se abeirava de um barco em saída. Mas fomos todos, rio acima, com ele nessa celebração, nesse embalo.
O barco, que saiu rio abaixo, chegou hoje ao mar, para navegar, navegar, sempre à vista, discretamente como sempre, mas à vista.
Quando eu morrer
Não me deem rosas
Mas ventos
Quero as ânsias do mar
Quero beber a espuma branca
De uma onda a quebrar
E vogar
Quando eu morrer
Não me deem rosas (x)
Ah, a rosa dos ventos
A correrem na ponta dos meus dedos
A correrem, a correrem sem parar
Onda sobre onda infinita como o mar
Como o mar inquieto
Num jeito de nunca mais parar
Por isso eu quero o mar
Morrer, ficar quieto, não
Ó, sentir sempre no peito
O tumulto do mundo
Da vida e de mim
E eu e o mundo
E a vida Ó mar
O meu coração fica para ti
Para ter a ilusão
De nunca mais parar”
Fausto Bordalo Dias
Não me deem rosas
Mas ventos
Quero as ânsias do mar
Quero beber a espuma branca
De uma onda a quebrar
E vogar
Quando eu morrer
Não me deem rosas (x)
Ah, a rosa dos ventos
A correrem na ponta dos meus dedos
A correrem, a correrem sem parar
Onda sobre onda infinita como o mar
Como o mar inquieto
Num jeito de nunca mais parar
Por isso eu quero o mar
Morrer, ficar quieto, não
Ó, sentir sempre no peito
O tumulto do mundo
Da vida e de mim
E eu e o mundo
E a vida Ó mar
O meu coração fica para ti
Para ter a ilusão
De nunca mais parar”
Fausto Bordalo Dias