|Assim repito o nome e sinto ainda o incêndio no rosto :|| paul celan |Porque é com nomes que alguém sabe | onde estar um corpo| por uma ideia, onde um pensamento | faz a vez da língua.| herberto helder
julho 14, 2022
julho 05, 2022
[11] Palimpsesto
π ...
@ Pena não conseguirmos escrever como quem olha.
@ ...
π ...
@ Somos nada, então?
π Somos silêncio. Não há como torná-lo palavra. A palavra estraga tudo, tu sabes.
@ O belo escreve-se de silêncio?
π ...
@ Passou tanto tempo.
π Noutra vida.
@ Tanto, que já não sei adivinhar-te.
π ...
@ Que já não sei adivinhar-me.
π ...
@ O futuro, fosse hoje, seria um presente vazio: desembrulhas, fitas e papel no chão e nada, nada de nada.
π ...
@ Tenho saudades de mim, em ti.
π Sempre disse que não percebes de amor.
@ Amar é dizer a verdade.
π Quando muito, amas-te a ti própria - tanto tempo e não me dás novidade alguma.
@ Tenho saudades de ti em mim.
π Ah, afinal, ..., o tempo amoleceu-te.
@ Eu morri em ti. Só isso.
π E os teus verbos continuam a não concordar com os substantivos.
π Ficarei assim, a olhar como quem escreve.
π ...
π ...
π ...
π ...
π ...
π ...
maio 31, 2022
maio 22, 2022
maio 20, 2022
maio 15, 2022
“e ela cegae ela sabe
ai onde vai
e ela cai
mas ao cair
finge-se cega
e ela entrega
sente o fundo
de quem a tem
e ela vem
sem que alguém
sinta chegar
e ela dor
deixa-te só
faz-te chorar
ela ensina
ela engana
ai a saudade
e o desejo
de mais um beijo
tocar a mão
e se ela existe
ela resiste
mesmo se os olhos
dizem que não ela insiste
espera em vão
mas ela é vida
triste a vida
sem ela”
Sitiados
abril 27, 2022
abril 22, 2022
abril 01, 2022
outubro 01, 2021
Enquanto espero resposta, envio nova carta
branca.
Prefiro que me respondas em silêncio
também.
Ninguém vive no que escreve:
apenas reescreve o presente num passado
triste.
julho 16, 2021
junho 03, 2021
©Elliott Erwitt | North Carolina | 1950 |
abril 18, 2021
abril 07, 2021
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©raquelsav | abril 2021 |
março 29, 2021
março 26, 2021
fevereiro 11, 2021
janeiro 22, 2021
Há palavras que não dizemos
e que pomos sem dizê-las nas coisas.
E as coisas guardam-nas,
e um dia respondem-nos com elas
e salvam-nos o mundo,
como um amor secreto
em cujos dois extremos
há uma só entrada.
Não haverá uma palavra
dessas que não dizemos
que tenhamos colocado
sem querer no nada?
******************************O ser começa entre as minhas mãos de homem.O ser,todas as mãos,qualquer palavra que se diga no mundo,o trabalho da tua morte,Deus, que não trabalha.
Mas o não ser também começa entre as minhas mãos de homem.
O não-ser,todas as mãos,a palavra que se diz fora do mundo, as férias da tua morte,a fadiga de Deus,a mãe que nunca terá filho,meu não morrer ontem.
Mas as minhas mãos de homem onde começam?
Roberto Juarroz | Poesia Vertical | Campo das letras| 1998
e que pomos sem dizê-las nas coisas.
E as coisas guardam-nas,
e um dia respondem-nos com elas
e salvam-nos o mundo,
como um amor secreto
em cujos dois extremos
há uma só entrada.
Não haverá uma palavra
dessas que não dizemos
que tenhamos colocado
sem querer no nada?
******************************
A PALAVRA HOMEMA palavra Homem, como vocábulono lugar que é o seuno dicionário Morais:entre hombridade e homenagem.
A cidadevelha e nova,muito animada, com árvorestambéme carros, aqui
ouço a palavra, o vocábuloouço-o muitas vezes aqui, podiadizer em que bocas, podia começara contá-las.
Onde não há amor
não pronuncies essa palavra.
Johannes Bobrowski | Sinais de tempo in Como um Respirar- Antologia poética | Edições Cotovia| 1990
não pronuncies essa palavra.
Johannes Bobrowski | Sinais de tempo in Como um Respirar- Antologia poética | Edições Cotovia| 1990
janeiro 21, 2021
decapita
a nomenclatura triste das coisas
e tudo passa a ter um só nome,
pressentido, vertiginoso, impronunciável.
Tudo joga o grande jogo:
desfilar,
transitar como um gesto de adeus,
tremer, saltar, pensar ou não pensar,
sentir, cair, calar o nome.
Calar o nome,
dizê-lo
sem a palavra agreste de uma linguagem.
Toda a realidade é afinal isto:
dizer um nome do outro modo.
Roberto Juarroz | Poesia Vertical | Campo das letras| 1998
janeiro 06, 2021
"Quem me dá certezas que o livro não tem?"
dezembro 23, 2020
dezembro 20, 2020
O rosto da voz
ALLERSEELEN
(TODOS-OS-SANTOS)
Que fiz
eu?
Inseminei a noite, como se outras
pudessem vir, mais nocturnas que
esta.
Voo de ave, voo de pedra, mil
trajectórias descritas. Olhares,
pilhados e colhidos. O mar,
provado, sorvido, absorto. Uma hora,
obscurecida de almas. A seguinte, uma luz outonal,
ofertada a um sentimento
cego, que tomou o caminho. Outras, muitas,
sem lugar e pesadas de si mesmas: avistadas e contornadas.
Rochas erráticas, estrelas,
negras e plenas de linguagem: nomeadas
por jura de silêncio rasgado.
E certa vez (quando? também isto se esqueceu):
o pulso sentiu o gancho,
quando ousava desprender-se.
Paul Celan, Não Sabemos mesmo O Que importa, Relógio D'Água, 2014
dezembro 19, 2020
novembro 21, 2020
novembro 06, 2020
([#1] Resposta de ninguém)
1
ligeiramente suspenso, pensei: nunca mais
poderei esquecê-lo. as longas, secas
estradas; os passos na água, nus,
e a perfeita esfera dos versos;
o instante em que o céu é redondo e
inútil,
são-me memória deste chãos, deste cuspo
espantado, no silêncio aberto das coisas.
mudo de rosto para ver-te. nenhum deus
te possui. o caule
do vento te cobre.
e descemos a luz, a transparência
os corredores solenes da lembrança
onde dormidas fúrias anoitecem.
confio na muda boa, ó gume fulvo
de ninguém!
as palavras existem no intervalo das palavras.
nenhuma imagem é o permanente futuro dos corpos
quando se enlaçam, quando se sonham
a colina e a água,
a cidade e o rosto
móvel da multidão apaixonada,
que se afasta correndo para o lado da terra
onde jamais arderam.
António Franco Alexandre | Poemas | Assírio&Alvim
outubro 28, 2020
outubro 05, 2020
outubro 01, 2020
![]() |
©Robert Mapplethorpe |
"Ingeborg,
Este ano chego "indefinidamente"e tarde. Mas talvez só seja assim porque não quero que ninguém além de ti esteja presente quando eu puser papoilas, muitas papoilas, e memória, também muita memória, dois ramos grandes e brilhantes na tua mesa de aniversário. Há semanas que antecipo com alegria esse momento.
Paul"
(Paris, 20 de Junho de 1949)
julho 31, 2020
![]() |
©raquelsav |
que lançámos à terra,
em ato polinizador acidental.
Errámos na estação:
- quem colhe,
aguarda em silêncio pela flor.
Escolhe, com exactidão,
o segundo de semear.
Mas nós despimos do grão o tegumento
e, no estio dos dias longos,
a semente secou.
Não cuidámos da espera,
sucumbimos,
na ânsia de a ver florir.
Antes de eclodir, dormimos,
para, depois, morrer.
E assim morremos sempre,
a cada Primavera.
julho 30, 2020
julho 28, 2020
julho 24, 2020
PLAY António Fragoso (1897-1918) | Prelúdio "Petite Suite"
13
explicar com palavras deste mundo
que partiu de mim um barco levando-me
julho 20, 2020
junho 09, 2020
"- Odeio gente que se mete com a literatura e depois não a sofre.
(...)
Acha que se as pessoas vivessem segundo os livros maiores estavam vivas?
- Os melhores não sobrevivem."
Maria Velho da Costa | Myra
maio 21, 2020
abril 12, 2020
abril 11, 2020
Não caibo nesta tarde que me desfolhas
sobre o coração. Renovam-se sob os passos
todos os caminhos e o dia é uma página que lida
e soletrada descubro inatingível como o vento a rua e a vida
As mesmas mãos que antes desfraldavam
domésticas insígnias baixo dos beirais
emprestam novos pássaros às árvores
Pétala a pétala chego à corola desta minha hora
Roubo o meu ser a qualquer outro tempo
não há em mim memória de alguma morte
em nenhum outro lugar me edifiquei
Arredondas à minha volta os lábios para me dizer
recuo de repente àquele princípio que em tua boca tive
Eu sei que só tu sabes o meu nome
tentar sabê-lo foi afinal o único
esforço importante da minha vida
Sinto-me olhado e não tenho mais ser
que ser visto por ti. Há no meu ombro lugar
para o teu cansaço e a minha altura é para ser medida
palmo a palmo pela tua mão ferida
Ruy Belo | Todos os poemas | Assírio & Alvim
"O medonho sentimento de incompletude de que nasce um antagonismo entre nós e o mundo talvez pudesse desaparecer, desde que um dos dois se modificasse: ou o mundo, ou nós; quimeras de insensatos, que eu execrava. No entanto, tendo chegado depois de uma longa introspecção a essa convicção de que, se o mundo se modificasse, eu deixaria de existir, e reciprocamente, descobri aí de modo bastante paradoxal uma reconciliação, uma possibilidade de compromisso. No sentido em que a coexistência era possível entre o mundo, por um lado, e por outro o pensamento de que não poderiam amar-me tal como eu era. A armadilha na qual o enfermo acaba sempre por cair não é a de resolver o antagonismo que o opõe ao mundo mas assumir integralmente esse antagonismo. E é por isso que o enfermo é incurável... incurável..."
Yukio Mishima | O templo dourado | Assírio & Alvim | p.84
abril 09, 2020
"283. A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ser alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas de espírito, todas da alma; és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. (...) Nascer liberto é a maior grandeza do homem."
Fernando Pessoa (Bernardo Soares) | Livro do desassossego |Assírio & Alvim