|Assim repito o nome e sinto ainda o incêndio no rosto :|| paul celan |Porque é com nomes que alguém sabe | onde estar um corpo| por uma ideia, onde um pensamento | faz a vez da língua.| herberto helder
setembro 21, 2023
©raquelsav | 2023 | Switzerland Matterhorn |
Mais largo o espaço, o sol mais criador,
Mais refulgente a lua, o mar maior,
Mais cavadas as ondas e mais belas;
Mais amplas, mais rasgadas as janelas
Das almas, mais rosais a abrir em flor,
Mais montanhas, mais asas de condor,
Mais sangue sobre a cruz das caravelas!
E abrir os braços e viver a vida,
— Quanto mais funda e lúgubre a descida
Mais alta é a ladeira que não cansa!
E, acabada a tarefa... em paz, contente,
Um dia adormecer, serenamente,
Como dorme no berço uma criança!
Florbela Espanca
setembro 15, 2023
©raquelsav | 2023 |
setembro 11, 2023
agosto 02, 2023
julho 16, 2023
©raquelsav | 2023 | Budapeste |
QUEM LEVARÁ O AMOR?
Quando meu ser pra sempre se fundir,
quem adorará violino do grilo?
Chama quem soprará no ramo frio?
Quem se deitará sobre o arco-iris?
Chorando, quem abraçará rochosas
ancas ora campos de leves ondas?
Quem acariciará duros cabelos
de raízes nas paredes, artérias?
E à fé devastadora erigirá
quem uma de injúrias catedral?
Quando meu ser pra sempre se fundir,
quem os abutres amedrontará?
E quem levará para a outra margem
o Amor em seus dentes apertado?
Nagy László (1925-1978) | Antologia da poesia húngaras | Âncora Editora | 2002 |
Trad. e Selec. Ernesto Rodrigues
julho 15, 2023
maio 20, 2023
fevereiro 21, 2023
fevereiro 08, 2023
dezembro 13, 2022
©raquelsav | 2022 | Castro Laboreiro |
PLAY Ash Ra Tempel | Day dream
"I will come to see after a year
To know if you'll be happier
And he vanished
In the secret of the universe
And he vanished
In the secret of the universe”
Ash Ra Tempel
novembro 20, 2022
outubro 29, 2022
![]() |
Funchal, década de 60 Padre João Vieira (15.02.1927 - 24.10.2022) |
outubro 09, 2022
outubro 01, 2022

© Elliott_Erwitt | Paris. 1998.

© Elliott_Erwitt | Paris. 1998.
Eu era lume sobre sede e tu procuravas dar-me a beber, gomo a gomo, laranja-cor-de-sangue de Simic. Demoravas repetidas vezes:
- A laranja parte-se em silêncio à entrada de noites fabulosas.
E eu ouvia cada sílaba, na cadência dos teus lábios secos. Não entendia. Sempre ouvira dizer que de manhã é ouro, à tarde prata mas que, à noite, a laranja mata. E era noite. Demasiadamente noite.
Desesperada, repeti, em fuga, baixo contínuo, o que me pareceu uma troca justa.
|| Um gomo por uma nota de Bach. Uma sílaba tua por uma nota de Bach:||
Tu recusaste. Disseste que eu não tinha a cabeça de vidro.
- Não és transparente e não se come laranja com a boca suja. Não distinguirias o doce da laranja do amargo da palavra. Nunca, para ti, o gomo secreto de Al Berto. Não és do lado de fora da cidade.
Ficámos em silêncio.
Impusemos a despedida.
________________________
Hoje, ainda te oiço:
- Tu não tens como matar a sede.
Concordo. Nunca possuirei a transparência louca e ácida de quem compreende a laranja. Mas releio-me na "alta solidão que nem pode ser nossa de tão pura".
E eu sei que
não há sede que a palavra, nos teus lábios, não (me) mate.
setembro 03, 2022
julho 14, 2022
"Terra Dormente"
julho 05, 2022
[11] Palimpsesto
π ...
@ Pena não conseguirmos escrever como quem olha.
@ ...
π ...
@ Somos nada, então?
π Somos silêncio. Não há como torná-lo palavra. A palavra estraga tudo, tu sabes.
@ O belo escreve-se de silêncio?
π ...
@ Passou tanto tempo.
π Noutra vida.
@ Tanto, que já não sei adivinhar-te.
π ...
@ Que já não sei adivinhar-me.
π ...
@ O futuro, fosse hoje, seria um presente vazio: desembrulhas, fitas e papel no chão e nada, nada de nada.
π ...
@ Tenho saudades de mim, em ti.
π Sempre disse que não percebes de amor.
@ Amar é dizer a verdade.
π Quando muito, amas-te a ti própria - tanto tempo e não me dás novidade alguma.
@ Tenho saudades de ti em mim.
π Ah, afinal, ..., o tempo amoleceu-te.
@ Eu morri em ti. Só isso.
π E os teus verbos continuam a não concordar com os substantivos.
π Ficarei assim, a olhar como quem escreve.
π ...
π ...
π ...
π ...
π ...
π ...
maio 31, 2022
maio 22, 2022
maio 20, 2022
maio 15, 2022
“e ela cegae ela sabe
ai onde vai
e ela cai
mas ao cair
finge-se cega
e ela entrega
sente o fundo
de quem a tem
e ela vem
sem que alguém
sinta chegar
e ela dor
deixa-te só
faz-te chorar
ela ensina
ela engana
ai a saudade
e o desejo
de mais um beijo
tocar a mão
e se ela existe
ela resiste
mesmo se os olhos
dizem que não ela insiste
espera em vão
mas ela é vida
triste a vida
sem ela”
Sitiados
abril 27, 2022
abril 22, 2022
abril 01, 2022
outubro 01, 2021
Enquanto espero resposta, envio nova carta
branca.
Prefiro que me respondas em silêncio
também.
Ninguém vive no que escreve:
apenas reescreve o presente num passado
triste.
julho 16, 2021
junho 03, 2021
©Elliott Erwitt | North Carolina | 1950 |
abril 18, 2021
abril 07, 2021
![]() |
©raquelsav | abril 2021 |
março 29, 2021
março 26, 2021
fevereiro 11, 2021
janeiro 22, 2021
Há palavras que não dizemos
e que pomos sem dizê-las nas coisas.
E as coisas guardam-nas,
e um dia respondem-nos com elas
e salvam-nos o mundo,
como um amor secreto
em cujos dois extremos
há uma só entrada.
Não haverá uma palavra
dessas que não dizemos
que tenhamos colocado
sem querer no nada?
******************************O ser começa entre as minhas mãos de homem.O ser,todas as mãos,qualquer palavra que se diga no mundo,o trabalho da tua morte,Deus, que não trabalha.
Mas o não ser também começa entre as minhas mãos de homem.
O não-ser,todas as mãos,a palavra que se diz fora do mundo, as férias da tua morte,a fadiga de Deus,a mãe que nunca terá filho,meu não morrer ontem.
Mas as minhas mãos de homem onde começam?
Roberto Juarroz | Poesia Vertical | Campo das letras| 1998
e que pomos sem dizê-las nas coisas.
E as coisas guardam-nas,
e um dia respondem-nos com elas
e salvam-nos o mundo,
como um amor secreto
em cujos dois extremos
há uma só entrada.
Não haverá uma palavra
dessas que não dizemos
que tenhamos colocado
sem querer no nada?
******************************
A PALAVRA HOMEMA palavra Homem, como vocábulono lugar que é o seuno dicionário Morais:entre hombridade e homenagem.
A cidadevelha e nova,muito animada, com árvorestambéme carros, aqui
ouço a palavra, o vocábuloouço-o muitas vezes aqui, podiadizer em que bocas, podia começara contá-las.
Onde não há amor
não pronuncies essa palavra.
Johannes Bobrowski | Sinais de tempo in Como um Respirar- Antologia poética | Edições Cotovia| 1990
não pronuncies essa palavra.
Johannes Bobrowski | Sinais de tempo in Como um Respirar- Antologia poética | Edições Cotovia| 1990
janeiro 21, 2021
decapita
a nomenclatura triste das coisas
e tudo passa a ter um só nome,
pressentido, vertiginoso, impronunciável.
Tudo joga o grande jogo:
desfilar,
transitar como um gesto de adeus,
tremer, saltar, pensar ou não pensar,
sentir, cair, calar o nome.
Calar o nome,
dizê-lo
sem a palavra agreste de uma linguagem.
Toda a realidade é afinal isto:
dizer um nome do outro modo.
Roberto Juarroz | Poesia Vertical | Campo das letras| 1998
janeiro 06, 2021
"Quem me dá certezas que o livro não tem?"
dezembro 23, 2020
dezembro 20, 2020
O rosto da voz
ALLERSEELEN
(TODOS-OS-SANTOS)
Que fiz
eu?
Inseminei a noite, como se outras
pudessem vir, mais nocturnas que
esta.
Voo de ave, voo de pedra, mil
trajectórias descritas. Olhares,
pilhados e colhidos. O mar,
provado, sorvido, absorto. Uma hora,
obscurecida de almas. A seguinte, uma luz outonal,
ofertada a um sentimento
cego, que tomou o caminho. Outras, muitas,
sem lugar e pesadas de si mesmas: avistadas e contornadas.
Rochas erráticas, estrelas,
negras e plenas de linguagem: nomeadas
por jura de silêncio rasgado.
E certa vez (quando? também isto se esqueceu):
o pulso sentiu o gancho,
quando ousava desprender-se.
Paul Celan, Não Sabemos mesmo O Que importa, Relógio D'Água, 2014