julho 01, 2024

 

©raquelsav | 2007 | Ponte das 3 Entradas

PLAY Fausto: Aproximação à Terra + E Fomos Pela Água do Rio

creio-nos em almas escancaradas
de jangada que toma de assalto as ternuras e delícias que flutuam na desconjuntada periferia do tempo

como se ali estivessem estado sempre,
as ternuras e delícias,
revistas no tempo de sempre
em escassos cinco minutos 
                    (dos nossos)
mas não! 
terão passado quatro. ou teriam sido cinco mil? 
daquela unidade de tempo maior 
medida pela dança da Terra à volta do Sol
     [sim, confirmei no Google a definição de um ano 
                                           (dos homens)]
o tempo é-nos sempre tão confuso 
a memória comum e a arqueologia dos dias de agora estão guardadas na magia de um clique
talvez à matéria das almas escancaradas não lhe assista factos tão perfeitamente inúteis

mas só podem ter sido quatro, ou teriam sido cinco mil?
unidades de tempo maior, condensadas num minuto 
                                         (do nosso encontro)

preciso-nos em almas escancaradas de gigante
sem garantir que o trajeto da nossa luz ao vazio se faça em porções de 1/299792458 de segundo ou em qualquer outra fração

perfeitamente maiores, seremos, pois,
nos passos do nosso encontro
à razão de sermos próximos das coisas que não se tocam,
feitos em pormenores do reflexo das árvores concretas
que flutuam e descansam nas águas do rio
na perfeita liberdade de ser-plano
                         (à tona do mundo de Edwin Abbott)

creio-nos em almas escancaradas
tão claras e distintas de detalhes
na complexidade que se esbate nas coisas planas e mágicas
em plena liberdade de existência

foge-nos o vício 
da morbidez 
         (da que os homens se habituaram a querer viver)
e escolhemos a matéria etérea e fugaz para existir
em almas escancaradas ao sabor e aroma do perfume das chuvas

esgueiramo-nos, sensíveis, aos toques ímpios na água 
                 (os que dissolvem a magia da revelação)
e somos de tal infinitas maneiras
que só o poema nos poderá eternizar.

sim, creio-nos em poesia! 
sim, creio!

PLAY Fausto: O perfume das Chuvas

(Raquel, 1.março.2014)

Aceno ao barco que vai rio acima

 

©raquelsav | 20 novembro 2022 | Aula Magna

PLAY Fausto Bordalo Dias | Quando eu morrer

Quem esteve na Aula Magna em 2022, sabe que a despedida física, ao homem, começou, se não antes, ali. Uma luta desleal entre um homem frágil e a sua obra imensa, uma luta titânica. O choro foi colectivo, entre a emoção e eco da obra e a saudade de um homem que embora não tivesse partido, já se abeirava de um barco em saída. Mas fomos todos, rio acima, com ele nessa celebração, nesse embalo.
O barco, que saiu rio abaixo, chegou hoje ao mar, para navegar, navegar, sempre à vista, discretamente como sempre, mas à vista.


Quando eu morrer 
Não me deem rosas 
Mas ventos 
Quero as ânsias do mar 
Quero beber a espuma branca
De uma onda a quebrar 
E vogar  
Quando eu morrer
Não me deem rosas (x)
Ah, a rosa dos ventos 
A correrem na ponta dos meus dedos 
A correrem, a correrem sem parar 
Onda sobre onda infinita como o mar 
Como o mar inquieto 
Num jeito de nunca mais parar 
Por isso eu quero o mar 
Morrer, ficar quieto, não  
Ó, sentir sempre no peito 
O tumulto do mundo 
Da vida e de mim 
E eu e o mundo 
E a vida Ó mar 
O meu coração fica para ti 
Para ter a ilusão 
De nunca mais parar”  
Fausto Bordalo Dias

junho 30, 2024

 

©Cornell Capa | 1960 | California, USA,  
Senator John F. Kennedy reaches his hands into a crowd while campaigning for the presidency

PLAY Grieg | Lyric Pieces Book V, Op. 54, No.4 Notturno 

SAQUE DE GUERRA

Dantes sabíamos o mundo de trás para a frente:
-era tão pequeno que cabia num aperto de mão,
tão simples que se deixava descrever com um sorriso,
tão comum como o eco de antigas verdades numa prece.

A História não nos saudou com uma fanfarra triunfante:
- em vez disso, atirou-nos areia para os olhos.
Diante de nós estavam caminhos distantes e sem saída,
poços envenenados e pão amargo.

O nosso saque de guerra foi conhecer o mundo:
- é tão grande que cabe num aperto de mão,
tão difícil que se deixa descrever num sorriso,
tão estranho como o eco das antigas verdades numa prece.

Wislawa Szymborska | Um inconcebível acaso | Edições do Saguão | 2023

junho 29, 2024

©Gustave Marissiaux | 1905 (oder früher) | Interior

PLAY Meredith Monk | Cow Song 

NATUREZA MORTA COM UM BALÃO

Em vez do regresso das recordações
na hora da minha morte
peço o regresso 
das coisas perdidas.

Por portas e janelas: sombrinhas,
malas, luvas, um casaco -
para que eu possa dizer:
Para que preciso eu de tudo isto?

Alfinetes, este pente e aquele,
uma rosa de papel, um cordel, uma faca,
para que eu possa dizer:
Nada disto me faz falta.

Chave, onde quer que estejas,
trata de chegar a horas
para que eu possa dizer:
Ferrugem, minha cara ferrugem.

Caia uma chuva de certificados,
licenças e questionários,
para que eu possa dizer:
O sol está a pôr-se.

Relógio, sai desse rio
e deixa-me pegar-te na mão,
para que eu possa dizer:
Tu finges ser a hora.

Há-de aparecer também um balão
arrebatado pelo vento
para que eu possa dizer:
Aqui não há crianças.

Voa pela janela aberta!
Voa pelo mundo afora!
Possa alguém exclamar: Oh!
Para que eu possa chorar.

Wislawa Szymborska | Um inconcebível acaso | Edições do Saguão | 2023

junho 28, 2024

 

Micha Bar Am | 1974 January | Egypt
The night before withdrawal of Israeli troops from Suez Canal, they gathered around a campfire

PLAY Current 93 | Chewing On Shadows

CANSAÇO
Há muito tempo que, meu rival, procuro um nome
para te dar;
tu impões-me o jugo, o pesado
saco de areia, o teu desgastado martelo;
convertes-me em escravo.

Levo-te do campo à sopa vespertina,
sinto o teu peso
quando a lua se levanta e voa um morcego.
À mesa os outros chamam-me sonhador
enquanto a minha nuca se inclina para ti
- à beira da derrota.

Rainer Brambach (1917-1983) Descida brusca de temperatura: alguma poesia suiça | 2023 | Contracapa

Queda de um grave

 - CVII -

O cansaço
é um abandono
da poesia de si  

junho 27, 2024

Fotograma do filme "O casamento de Maria Braun" realizado por Rainer Werner Fassbinder (1978)

©Ludwig David | 1897  | Ohne Titel (Mann im Schne) 

É a terra que se distancia
Ou o horizonte que se aproxima
Não se saberá nunca nessas grandes distâncias
Encontrar a medida certa
Do que se ganha ou perde

Anne Perrier (1922-2017) | Descida brusca de temperatura: alguma poesia suiça | 2023 | Contracapa

junho 26, 2024

Da criação

©Edward Steichen | 1902 | Rodin, Le Penseur


nāsadīya sūkta
"Hino da Criação" (10.129)

1. [No início] não existia nem o existente nem o não-existente; não existia o espaço vazio nem o céu acima dele. O que havia então? Em que lugar? Quem zelava [por tudo]? Havia água [ou] o céu infinito? ||

2. Não existia então a morte nem a imortalidade. A noite e o dia não se distinguiam. [Mas] algo existia, sem ar, por própria vontade, [e] nada mais havai para além disso ||

3. No início o infinito estava oculto de escuridão; sem qualquer outro sinal, tudo isto era água. O espírito contido no nada pelo poder de Tapas surgiu ||

4. O desejo foi o primeiro a aparecer nele; eis a primeira origem do pensamentos. Os Rsis encontraram com sabedoria nos seus corações o elo entre o existente e o não-existente ||

5. Este pensamento desenvolveu-se. Existia em cima? Existia em baixo? Surgiram [então] os lugares de origem; surgiram os poderes. Houve um impulso em baixo; houve outro em cima ||

6. Quem realmente pode saber? Quem na verdade poderá dizer? Houve em dia origem? Deu-se a criação? Os deuses apareceram depois do universo ter sido criado. Quem então sabe de onde surgiu isto tudo? ||

7. Uma vez criação aparecida - talvez se tenha formado por si mesma ou talvez não - aquele que zela por ela, no mais alto dos céus, só ele sabe - ou será que não ||

(in Bhagavad-gita, Ésquilo trad. José Carlos Calazans, p. 286)

©Carl Frederiksen | 1912 | Nebliger Morgen

PLAY Bach | Nun komm der Heiden Heiland, Chorale Prelude BWV 659 (Transcr. by Ferruccio Busoni) | Víkingur Ólafsson


TRANSFIGURAÇÃO
Como a imagem maculada de bosques polvilhados de nevoeiro e dissabores,
A chegada do teu destino é vergonhosa e absurda.
Furtiva, a tristeza verga-se como o chefe de uma tribo derrotada,
Partindo com dor o pão humedecido
E contendo o gemido de um sofrimento extenuante.

Aos meus amigos resistentes que sem caprichos andam
Não tenho nada a objectar nem nada que retribua
As dúvidas do meu amor, os contornos do seu fluxo,
A mísera desonra, o seu fio de paciência.
Pagarei a minha dúvida com a cruz lamacenta ao peito.
Devolver-lhes-ei a dúvida como um espelho partido
Reconheço o engano ingénuo dos sonhos,
A troca do rosto, por mim mesmo, o laço
Tenso dos meus espaços por velas cobertas de crostas.
Devolver-lhes-ei a dúvida com uma palavra de desprezo dirigida a mim.
Andrei Tarkovski | Carta sem destinatário: Primeiros textos e poemas | Sr Teste Edições | 2024

Queda de um grave

 - CVIII -

O desdouro 
nasce no espelho
que não imita a vida

junho 25, 2024

Da criação

©Rene Burri | 1964 | Beijing-China

 O nascimento do mundo (Teogonia 116-138)

Primeiro que tudo, nasceu o Caos. Logo depois,
a Terra [Gaia] de amplo peito, sede segura para sempre de todos
os imortais que detêm os píncaros do Olimpo cheio de neve;
e o Tártaro sombrio no recôndito da terra de amplos caminhos;
e Eros, que é o mais belo entre os deuses imortais,
deslassador de membros; e de todos os deuses e de todos os homens
ele subjuga no peito a mente e o prudente conselho.
Do Caos nasceram o Érebo e a negra Noite.
Da Noite, por sua vez, o Éter e o Dia nasceram,
que ela pariu, engravidada, tendo-se unido em amor ao Érebo.
A Terra primeiramente deu à luz, de igual tamanho a ela,
o Céu [Úrano] chio de astros, para que ele a cobrisse completamente,
para que houvesse para os deuses bem-aventurados uma sede segura para sempre;
deu à luz grandes montanhas, graciosas moradas das deusas
Ninfas, que vivem nas montanhas cheias de bosques;
deu à luz o mar nunca vindimado inchado de ondulação,
Ponto, sem prazeroso ato de amor, mas depois,
deitando-se com o Céu, deu à luz o Oceano de fundos remoinhos;
e Coio e Creio e Hiperíon e Iápeto
e Teia e Reia e Témis e Mnemósine
e Febe da coroa dourada de Tétis amorável.
Depois destes nasceu o mais novo, Crono de retorcidos conselhos,
o mais terrível de seus filhos; e ele odiava seu vigoroso progenitor.

Hesíodo | Teogonia in Poesia Grega de Hesíodo a Teócrito | Tradu. Frederico Lourenço | 2023 | Quetzal

©Inge Morath | 1962 | From the Mask Series with Steinberg

A nossa moral é um mecanismo psicossocial para permitir cooperação (...) surgiu sob certas condições, no nosso ambiente de adaptabilidade evolutiva (...) Este meio ambiente tornou-nos flexíveis, inteligentes e cooperativos, mas também nos tornou tribalistas e propensos à violência. p.43

Hanno Sauer | Moral - A invenção do bem e do mal | Edições Saída de Emergência | 2023

junho 24, 2024

 

©raquelsav

“Alexandra sentou-se na cama e acendeu o primeiro cigarro da manhã. Diante dela, no espelho da porta do quarto, via uma mulher de queixo apoiado nos joelhos, os braços a envolverem as pernas, e a pensar que uma coisa tinha aprendido pelo menos com o Steve: o medo de amar. É que toda a ânsia com que ele queria legalizar a situação não podia ter outro nome. Medo, qualquer estúpida saberia. Ou insegurança, se assim quiserem chamar.”

José Cardoso Pires | Alexandra Alpha | Publicações Dom Quixote

Queda de um grave

- CIX -

O impossível 
fixa-se no olhar
de quem insiste não ver

junho 23, 2024

©raquelsav | 2024 | Sintra
 

PLAY J.S. Bach | Suite Francesa, n.º 5 | Interpretada por András Schiff

"J.S. Bach nunca terá saído do seu país natal, a Alemanha. Mas o facto de não ter viajado pela Europa não o terá impedido de contactar com as tradições musicais de outras culturas. Do estilo francês, conhecia  os trabalho de Couperin e Rameau, que usou nas suas composições. Bach compôs, as Suites Francesas, incorporando vários elementos representativos de estilos usados por toda a Europa. A Allemande tem origem alemã, mas a Courante é uma dança proveniente de França, a Sarabande alude a uma dança espanhola e a Gigue tem origem escocesa / irlandesa. E que harmoniosas soam todas juntas! Que bom seria, nesta complexa conjuntura mundial em que vivemos, que os políticos partilhassem deste espírito de Bach. Imagine-se, que por via do Brexit, excluíamos a Gigue da Suite Francesa, seria uma pena."

[Transcrição livre, de um momento introdutório ao seu recital, do pianista húngaro-britânico András Schiff, Sintra, Centro Cultural Olga Cadaval, 23/06/2024, 11:00-13:40]

junho 22, 2024

 

©Nan Goldin, do livro The Ballad of sexual dependency

"Sex itself is only one aspect of sexual dependency. Pleasure becomes the motivation, but real satisfaction is romantic... Sex isn't about performance; it's about a certain kind of communication founded on trust and exposure and vulnerability that can't be expressed any other way...You become dependent on the gratification." . p.8

Nan Goldin | The Ballad of sexual dependency | Aperture | 2012

junho 21, 2024

©Werner Bischof | 1947 | After the War A figure stands in silhouette at a circus | Hungary 

PLAY Karol Szymanowski | 9 Preludes, Op. 1: N.º 1 in B minor | Krystian Zimmerman

O ESPELHO
Sim, lembro-me dessa parede
da nossa cidade em escombros.
Projectava-se quase até ao sexto andar.
No quarto andar tinha um espelho,
um espelho inconcebível,
inteiro e bem preso à parede.

Já não reflectia o rosto de ninguém,
nem as mãos que compunham o cabelo,
nem a porta que ficava em frente,
nada que se pudesse chamar 
lugar.

Era como de estivesse de férias -
mirava-se nele o céu vívido,
nuvens em bulício no ar bravio,
a poeira dos escombros lavada por chuvas brilhantes,
pássaros em vôo, estrelas, o nascer-do-sol.

E, como todo o objecto bem fabricado,
funcionava na perfeição,
com uma profissional falta de espanto.

Wislawa Szymborska | Um inconcebível acaso | Edições do Saguão | 2023

junho 20, 2024

©raquelsav


Morte ao meio-dia
No meu país não acontece nada
à terra vai-se pela estrada em frente
Novembro é quanta cor o céu consente
às casas com que o frio abre a praça
Dezembro vibra vidros brande as folhas
a brisa sopra e corre e varre o adro menos mal
que o mais zeloso varredor municipal
mas que fazer de toda esta cor azul
que cobre os campos neste meu país do sul?
A gente é previdente tem saúde e assistência cala-se
e mais nada
A boca é pra comer e pra trazer fechada
o único caminho é direito ao sol
No meu país não acontece nada
o corpo curva ao peso de uma alma que não sente
Todos temos janela para o mar voltada
o fisco vela e a palavra era para toda a gente
E juntam-se na casa portuguesa
a saudade e o transístor sob o céu azul
A indústria prospera e fazem-se ao abrigo
da velha lei mental pastilhas de mentol
O português paga calado cada prestação
Para banhos de sol nem casa se precisa
E cai-nos sobre os ombros quer a arma quer a sisa
e o colégio do ódio é a patriótica organização
Morre-se a ocidente como o sol à tarde
Cai a sirene sob o sol a pino
Da inspecção do rosto o próprio olhar nos arde
Nesta orla costeira qual de nós foi um dia menino?
Há neste mundo seres para quem
a vida não contém contentamento
E a nação faz um apelo à mãe
atenta a gravidade do momento
O meu país é o que o mar não quer
é o pescador cuspido à praia à luz do dia
pois a areia cresceu e o povo em vão requer
curvado o que de fronte erguida já lhe pertencia
A minha terra é uma grande estrada
que põe a pedra entre o homem e a mulher
O homem vende a vida e verga sob a enxada
O meu país é o que o mar não quer
Ruy Belo | País Possível

junho 19, 2024

junho 18, 2024

 

©Werner Bischof | 1948 | Finland
PLAY The Cramps | Human Fly

A primeira transformação moral fundamental do ser humano terá porventura consistido na descoberta da moral. A maioria das espécieis animais conhecem regularidades de comportamentos que permitem e promovem a coesão de grupo. Os cardumes de peixes, que parecem seguir de forma fantasmagórica um ritmo inaudível, cooperam através da conformidade; insectos sociais como as abelhas ou formigas aperfeiçoaram uma divisão de tarefas que exige, muitas vezes, o autossacrifício total do indivíduo em benefício, repectivamente, da colmeia ou colónia. A especial forma de cooperação, que moldou a moral dos seres humanos, consiste em relegar para segundo plano o interesse da pessoa singular em benefício de um maior bem comum com o qual todos lucram. p.23

Hanno Sauer | Moral - A invenção do bem e do mal | Edições Saída de Emergência | 2023

junho 16, 2024

 



"Nós somos racionais!"
Tu és racional.
Eu seria racional!

junho 15, 2024

©raquelsav | jun 2024

PLAY Joaquín Rodrigo | Concierto de Aranjuez 

Farei como Shiva me ensinou:  

- alimentarei de dança suave o ímpeto destruidor; 

- procurarei o movimento perpétuo dos braços, na busca do equilíbrio das mãos.   

E, na esperança do reencontro, conservarei intacto o Cioran.

junho 04, 2024

 



Fotograma de "Die bitteren Tränen der Petra von Kant" | 1972 | Rainer Werner Fassbinder

maio 26, 2024

 

©raquelsav | 2024

Foi mera casualidade, a “instalação”. Mas suscitou-me interesse. A associação do livro ao objecto. Ao objecto rosa-choque. A veia progressista que me assiste impele à mão o gesto. Soube-me bem. Foi como dar um murro na mesa por cada palavra lida, não

abril 16, 2024

 

©raquelsav | 2024 | Lisboa

Uma, parecida com esta, ensinou-me mais do que algumas lições da escola.
Ainda sinto o cheiro da ansiedade na fila de espera! 

abril 07, 2024

 

©raquelsav | 2023 | Lauterbrunnen

PLAY Mão Morta | O Mundo Não É Mais um Lugar Seguro

março 18, 2024

 

©raquelsav | 2014 | Lodz

PAUL CELAN, ANTES DE ATRAVESSAR A PONTE MIRABEAU
Se um quarto se pode abrir para o sonho,
quando a noite é pesada e o barulho da chuva entra
pela janela, já o sonho não se abre para quem não
dorme, enrolado na insónia como num velho
cobertor. Então, o que se passa pela cabeça são
os pensamentos que não se deveriam ter. Mas a
noite é assim: não faz distinção entre quem dorme
e quem está acordado; e o barulho da chuva
aumenta, com o vento, trazendo o que está
fora do quarto para dentro do quarto, e obriga
quem não dorme a agarrar-se ao cobertor, como
se fosse a última bóia no naufrágio da noite.


Nuno Júdice | Fórmulas de uma luz inexplicável

março 14, 2024

 


fevereiro 19, 2024

Pipota

 

©raquelsav | 2024 | πpota


fevereiro 16, 2024

 

©raquelsav | 2022 | Somiedo


“Palavras constroem pontes em regiões inexploradas”
Não tenho como confirmar o autor desta afirmação. Será:
- do filósofo da linguagem Ludwig Wittgenstein? Até faria algum sentido, para quem, como ele, tanto indagou sobre o significado das palavras;
- do escritor Gonçalo M. Tavares? De certo modo, podia enquadrar-se na sua linha editorial;
- do papa Francisco? Por que não? Grande parte da sua ação tem consistido em (procurar) criar pontes improváveis e desafiantes.
Enfim, são muitos os candidatos a autor que eu equacionaria.
Mas diz a “internet” que esta frase foi usada (criada?) por Adolf Hitler.
Aferir a veracidade desta atribuição não é fácil e parece-me secundário, neste momento. Mas não deixa de ser, para mim, desarmante, e até confrangedor, rever-me numa ideia (supostamente) compactuada por Adolf Hitler.
Esta situação alertou-me para o perigo que consiste em embarcar numa ideia “bonita”, mas ideologicamente descontextualizada ou alheia às suas origens. Advertiu-me sobre a responsabilidade que tenho em me manter vigilante relativamente às ideias que vou ouvindo, e arrumando em gavetas circunscritas a um determinado contexto. De me situar nelas e repensar o meu “pequeno” papel de cidadã na grande ambição que é manter a (tão frágil) democracia no mundo, no meu país. Tornou-se tão exigente esse papel!
Eu ainda acredito que ao cidadão contemporâneo comum, compete não desistir de discernir entre a verdade da mentira ( ou será a mentira da verdade?). Mas não acredito em verdades absolutas (passo o paradoxo da afirmação). E, não descurando da sua relatividade, considero que há “verdades” que, realmente, são mais verdadeiras (diria interessantes, mobilizadoras e construtivas) do que outras. A democracia (o sistema mais, imperfeitamente, justo que conheço) compensa o esforço de as destrinçar.
Cuidarei, por isso, de ouvir as palavras, de as registar antes que as leve o vento, e de apanhar as verdades, nem que seja à moda dos Naifa, com enganos.

fevereiro 08, 2024

 

©raquelsav

-Boa tarde, em que lhe posso ser útil?

-Boa tarde, para mim, vai ser uma tranquilidade igual a esta, se faz favor.

-É para já, quem não tem gato, caça com cão.

fevereiro 02, 2024

 

©raquelsav | 2022 | Alcobaça (Espanha)

Quando penso em Portugal e respetivas oportunidades, alternativas, ensejos, etc., ocorre-me esta foto. Retrata uma remota localidade espanhola, fronteiriça, chamada Alcobaça - muito próxima de Castro Laboreiro. Na placa, de leitura difícil, lê-se Portugal. Para quem, de regresso, avista uma placa com o nome do seu país, é levado a respirar de alívio. Contudo, a placa conduz-nos a uma estrada estreitíssima, nada apelativa a condutores menos experientes ou afoitos. Chegamos a Portugal se confiarmos no caminho que nos indicam? Talvez! Mas não sem danificar a viatura e vendo vedada a possibilidade de inverter a marcha. A decisão não é difícil. Seguimos, então, de olhos bem fechados, pelo atalho de terra batida, ali mesmo ao lado, sem meta que se afigure, sem chão que se palpe. Não há-de ser pior do que as rasteiras do caminho “seguro”. Chegaremos, sem dúvida, sãos e salvos, mas muito tardiamente e quase mortos de cansaço. Quase mortos e só quase- porque isto de ser português de Portugal não mata, de facto, só mói.