abril 02, 2015

O Medidor de Passos

O Medidor de Passos. 2 Abril (Sessão Extra). Teatro Virgínia AQUI

"1. O actor e o esqueleto

   As palavras inscritas no Osso (é assim que deve ser). O músculo diz a parte interior, isto é: a alma. O músculo diz a alma das palavras, enquanto a parte menor são as letras aparecidas como a surpresa sonora da voz. Quase nada, portanto.
   Porque o músculo é mais importante; e o osso é mais importante. 
   E o texto para o actor é a bengala: a vara de madeira que suporta o coração. Enquanto o coração, esse, é a parte alta do actor; a torre de onde se pode ver Deus e os homens. (E não se deve confundir a bengala com a perna).
   Porque a palavra ajuda-nos a não cair
   e o coração ajuda-nos a subir. É diferente.
   E entre o cair e sujar-se (a terra)
   e o subir e salvar-se (o céu)
   existe o esqueleto do actor: a linguagem da morte (os ossos) tapada pelo tecido da vida: a pele.
   Porque o texto da peça foi encontrado no osso; no seu centro. E o coração do actor é sangue quase tudo, palavras e movimento (e é assim que deve ser)."


"11. Provar no vivo a existência do morto

Não basta beijar a boca, isso é fácil,
é preciso beijar os ossos,
provar que eles existem."

Gonçalo M. Tavares,
A colher de Samuel Beckett e outros texto, Campos das Letras, 2002